29.2.08

o ameaçador orgão público

Cinemateca. Lá estave eu. Com um projeto na mão. Um sonho no coração.

Podem achar bobo. Mas estava nervosa. De repente uma garotinha. Tinha que entrar no castelo do gigante. Eu fiz tudo certo. Madrugadas a fio vendo e revendo o orçamento. Fazendo contas. Lendo e relendo meu sonho.

Quixote. Só podia ser ele a me ajudar a enfrentar o gigante de nome estranho: Rouanet. Pelo meu "Quixote" eu entrei na "Cova de Montesinos" e nem tive medo do quadro com a foto do Lula na parede. Me senti importante. Eu tava lá propondo o meu teatro.

E não é que a moça que me atendeu foi simpática? E ainda elogiou o projeto. Tá. Hoje eu tou orgulhosa. Confesso. Com pouco. Mas orgulhosa. Só de ver meu nomezinho no site do Minc...

Sem nenhum tostão no bolso ainda. Mas o coração voando longe. Com meus moinhos. Sempre. Sempre.

25.2.08

de dentro do latão de lixo

Beckett. Lata de Lixo. Beckett. Fim de Partida. Beckett. Nell.

Um presente que ganhei esse ano. Entrar no universo beckettiano não é fácil. Experiência de destruição. Condição desumana. Últimos sobreviventes de uma catastofre. A Guerra.

Eu fico ali. Dentro de um latão de lixo. Só escutando os personagens de uma história sem história. Que lutam por nada. Que vêem o tempo passar em um relógio parado no zero. O patético é engraçado. Mas incomoda. Sufoca.

Confinamento. Realmente me sinto uma mutilada. Lá sou a Nell. Lá não sou ninguém. Sou alguém. Choro. Dou risada.

Beckett e sua realidade brutal. Realidade sim. Realidade que vem à tona em uma situção tão irreal quanto possível. Difícil de explicar.

Não sei se prefiro o começo. O fim. O meio. Só sei que é bom estar ali. Apesar de tudo: Beckett pulsa vida.

Perla Frenda em "Fim de Partida" - foto: Marcelo Kahn

20.2.08

cortinas mofadas

O teatro muitas vezes te surpreende em uma terça a noite. Centrão de São Paulo. Teatro pseudo-restaurado. E lá estava eu no Maria Della Costa para prestigiar um amigo. Um clima de decadência nostálgica toma conta daquele lugar. De repente senti saudades. De algo que não vivi. Deve ter sido das minhas leituras sobre o teatro paulistano e o antigo TBC. Parecia estar naquela época.

Foi bom. Subir uma escadaria para entrar na sala. Me deparar com um teatro gigante. Suas cadeiras de couro rasgado. Pé direito enorme. Clima misterioso. Foi bom. Olhar para aquela cortina mofada.

A cortina. Hoje em dia não está na moda. O clima da peça já é entregue assim que adentramos os teatros. O que é muito legal também.

Mas, ao me deparar com ela hoje. Imponente. Fiquei ansiosa. Sentada ali. Olhando. Olhando. Esperando pelo que estava atrás. Algo mágico. Ultrapassa o veludo vermelho. Terceiro Sinal. Tum Tum. Vai começar.

14.2.08

as violetas rompem rochas

A vida não faz nenhum sentido. Por isso nós damos algum tipo de sentido através da criação.
(Tenneesee Williams)



Felipe Schermann, Flávia Lorenzi, Fabiana Scaglioni,
Clodoaldo Dias e Camila Raffanti em cena de Camino Real


Assim é Camino Real. Um porto de chegada e de partidas. Um lugar onde o figuras transitam esquecidas por todos. Numa aridez mecânica. Onde no fundo, moram corações lutando por um último fio de vida.

Assim escreveu Teneessee. Assim reescreveu a Antikatártika. Um processo de criação que não só entrou em contato com as palavras do dramaturgo. Cada um deles realmente morou dentro do Camino. Na Plaza. Nada anti. Muito katártika.

Um Quixote abandonado por seu Sancho. Sem desistir. Nunca. Segue em frente... e novamente ... e novamente...

Por ter feito. Por fazer. Por romper. Por chorar. Junto com eles. Recomendo a todos essa montagem na Mostra do Folias esse final de semana.
(vide informações ao lado)


As violetas.
As rochas.
A vida.

12.2.08

morar num clipe

Não consigo achar uma música e um clipe que me dê mais vontande de "morar dentro" do que Elephant Gun, do Beirut. Se teatro fosse um clipe, o teatro seria ele.




Um delírio dionisíaco.
Deleite.

9.2.08

alegria só se for pro bradesco

Me revolto. Começou ontem mais uma palhaçada. Nova temporada do Cirque de Soleil. Acho lindo. Mesmo. Mas lá no Canadá. Alegria.

Jornal da Globo hoje. Reportagem patética tentando justificar os gastos do Circo. Depoimentos de que eles precisam de parceiros para continuar o sonho. O Bradesco se refestela. Bonitinho né? Patrocinar um evento lindo desses em terra tupiniquim. Alegria.

Alegria. É o que eu não sinto ao lembrar que o espetáculo Saltimbanco, última temporada no Brasil, veio da Lei Rouanet. Que teria que estar ajudando a cultura nacional. O imposto de renda do Bradesco vai pro circo. Eles não gastam. Ainda por cima. Cobram a bagatela de R$400,00 o ingresso. Preço esse que só pode ser pago por quem pode ir viajar pro Canadá e assistir sim, sem peso na consciência, o Cirque du Soleil em sua terra natal. Alegria.

Quem se beneficia com isso mesmo? Que cultura é trazida pra cá?

Dá pra ver o Cirque aqui da janela do meu quarto. Vista linda pro parque Villa Lobos. Estou vendo a fila imensa de brasileiros que, com seu sálario minímo, não compram nem um ingresso. Que circo as pessoas podem ver se precisam de Bolsa Família? Nossa. Alegria. O Circo somos nós.

7.2.08

sobrevivendo

Como é díficil a vida do teatro de grupo no Brasil. Apesar de ser mais fácil um ator sobreviver em um grupo do que sozinho lançado aos leões. Cansativa é. Essa sobrevivência. Não conseguir viver da profissão mata.

É como andar num campo minado. Tentando pisar no lugar certo. Querer ser profissional. Onde tudo leva pro anti-profissional.

Uma profissão que tem que ser tratada com rigor não pode cobrar isso. Não tem como pagar seus sobreviventes. Viver de bilheteria é piada. As leis de incentivo...melhor ir pra Punta Del´este. Um grupo de teatro tem que ficar sambando entre horários, testes, faltas, desistências. Ensaios em lugar precário. Favores. Algo que vive de favor pode ser chamado de profissional?

Eu queria poder pagar uma sala de ensaio. Sem precisar mendigar.
Eu queria poder pagar meu figurino. Sem me bater por retalhos.
Eu queria ser atriz. Sem ter que dar explicações.

2.2.08

o dia em que entederem o que é o carnaval

Skindô. Skindô.

Por que a única manifestação em massa da cultural brasileira é tratada de forma tão banal? Bunda. Famosos. Cerveja. Cadê o samba? Segundo plano.

Tristeza. Ao pensar que uma grande festa como essa possa ser tratada pela visão do sexo, das bebidas e nada mais. As comunidades estão esquecidas, o samba deu lugar ao tráfico e a cultura deu lugar a mídia.

A Igreja ainda influencia. Os argumentos acabam. Onde só se mostra bunda realmente não é lugar para tratar do holocausto. A fantasia rasgada. O único momento em que teríamos força popular pra manifestar. Perdido.

Quem pula o carnaval não entende. Quem entende como ele é hoje, despreza. A cultura genuína brasileira vai pro brejo.

Maracatu vira abadá. Frevo vira trio-elétrico. Sambista, prostituta.

Um país que trata assim a sua cultura. Brasil.

Nada mais.
 
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