30.1.08

teatrante andante

As vezes quero comprar uma Kombi velha e nela montar um palco.Como se fosse uma Cia. de Commédia dell'Arte. Sair por aí. Máscara. Ter um palco como morada. Alegria.

Toda vez que vejo um filme que tem artistas peregrinos fico comovida. Em pensar que foram eles que profissionalizaram o fazer teatral. Os primeiros atores a viverem da arte. Se não fossem as estradas... dedicação.

Pena que hoje. O ator à margem. Todo o desgaste daquelas carroças foram em vão. Me devolva minha profissão. Seu Pantaleão!

Capitão, tenha coragem. Uma vez na vida. Chama o Brighella pra essa luta. Não vire um Pulcinella. Me deixe ser o Arlequim. Que não quero que o teatro vire um Tartaglia. Gago. Míope. Esquecido.


Aline Baba e Felipe Thiago em Arlequim no Carnaval (foto: Mariana Noguera)

27.1.08

texto versus encenação

Umas das célebres frases do diretor, René Piazentin, é que devemos ter dois exemplares do livro O Teatro e seu Duplo, de Antonin Artaud. Um, ele diz, pra ficar na cabeceira, e outro, para por num quadro. Essa leitura realmente é indispensável para quem quer pensar em um teatro viceral.

Muito revoltado com a idolatria com que são tratados os textos e com a forma endurecida das encenações que colocam a obra e o autor em primeiro lugar, ele nos propõe um novo teatro muito mais vivo.

Isso significa que, em vez de voltar a textos considerados como definitivos e sagrados, importa antes de tudo romper a sujeição do teatro ao texto e reencontrar a noção de uma espécie de linguagem única, a meio caminho entre o gesto e o pensamento. (Antonin Artaud)

Ele tem uma visão muito radical contra as encenações clássicas, ele diz até em "acabar com as obras primas". Mas quando você entende bem o que ele está querendo propor seus olhos começam a brilhar.

Um teatro cujo principal beneficiado é o encenador, que passa a ser o "senhor" da obra, afinal de contas, o produto final é muito mais mérito dele do que do autor do texto, que morreu há séculos atrás.

Uma encenação de Hamlet nunca é igual a outra. Porque Shakespeare leva o mérito de todas se quem as idealiza são os atores e o diretor? É nesse sentido que Artaud diz que as palavras tem que ter o mesmo, ou até menor peso do que o gesto, o silêncio, a trilha sonora, a iluminação, o figurino, o cenário. A força do texto está no papel. No palco a força vem de cada um de nós. Do nosso suor. Mérito. Total.

25.1.08

teatro a gente não vê por aqui

Hoje, como aniversaria minha querida São Paulo, gostoria de fazer um protesto.

Teatro, a gente vê por aqui. Rede Globo. Nada mais é do que a tentativa de domínio da cena do teatro paulistano. Não. Aqui a gente não vê teatro pela Globo. Na Globo eu vejo novela.

Abaixo às peças caras, com incentivos fiscais roubados de nossos grupos e atores globais. Aqui tem Vento Forte. Aqui tem Folias. Aqui tem Oficina. Aqui tem Antunes. Aqui tem Satyros. Aqui tem Praça Roosevelt. Aqui tem uma série de companhias competentes que resistem.

O teatro do Rio de Janeiro acabou. Mas em São Paulo eu tenho escolha se não quiser ver uma comédia no estilo do escabroso programa Toma lá da Cá (vergonha alheia do Diogo Vilela fazendo esse papel).

Esse protesto é a favor da liberdade de escolha. A favor da resistência que infelizmente, só tem um número significativo no teatro paulistano (a ponto de incomodar a Globo). A favor do meu, do seu, do nosso Teatro.

Globo: teatro a gente vê aqui ao vivo. Em São Paulo. Quando eu quiser ver novela eu ligo minha TV, ok?

24.1.08

descrição de sentimento

Na eterna busca de algo que possa descrever o que sinto achei essa citação. Nunca palavras se encaixaram tão bem a sentimentos. Artaud é o mestre, e sua lição um capítulo à parte.

Quando vivo não me sinto viver. Mas quando represento sinto-me existir. O que me impediria de acreditar no sonho do teatro quando creio no sonho da realidade? Quando sonho faço alguma coisa, e no teatro faço alguma coisa. (Antonin Artaud)

23.1.08

foi efêmero mas ficou

O Théâtre du Soleil passou pelo Brasil. Eu quase perdi. Não tinham mais ingressos. Chuva. Coragem. Um amiga guerreira. Fomos lá. Ariane Mnouchkine, como se fosse uma qualquer, passeava pelas pessoas e cuidava pessoalmente dos convidados. Pessoas esperançosas debaixo de um temporal pediam uma senha. E, apenas a diretora do grupo que todos os grupos do mundo queriam ser pessoalmente, deixou todos entrarem. Dando boas-vindas.

Ali já via que algo de epecial estava para acontecer. Paris é o sonho de todos
que fazem teatro. Lá ele acontece. Mas só estando naquela tarde no SESC
Belenzinho é que eu pude sentir essa força. Me senti pequena. Mas maravilhada.

Aquilo sim é um ritual. Trabalho pelo teatro. A própria diretora te recebe. As próprias pessoas do grupo te oferencem um jantar maravilhoso. Com direito a queijo,vinho e mel. Seis horas de espetáculo. Achei que ia ser cansativo. Tipo Teatro Oficina. Não. Quando acabou eu queria mais.

Um espetacúlo que fala do efêmero. De cenas cotidianas. De depoimentos pessoais. Tão líricos. Tão precisos. Tão fascinantes. Um tema tão simples que tinha tudo pra dar errado ou ficar incompreensível. A vida estava absurdamente ali, em cada cena. Um travesti que acende velas sozinho pra comemorar seu aniversário. A maravilhosa e cativante velhinha Madme. Perle que queria viajar para a Mesopotâmia. Uma criança vestida de tigre pulando num sofá. Um marido que morre e uma esposa que continua tomando a sopa. Tudo tão preciso. A legenda nem seria necessária.

O cenário. A arena. Pequenos pedaços de lares que giravam em pequenos palcos com rodinha. Eu daria qualquer coisa para ser uma daquelas pessoas que só empurrava os cenários. A cada momento eu pensava que podia ser uma daquelas personagens. Em um espetáculo com um tema tão individualista cada um do público podia ver um pedaço de si mesmo naqueles atores. Tão envolvente quanto um filme de cinema. Tão perfeito que parecia não estar ali.

Se aqui no Brasil um dia eu conseguir ver algo que de longe se assemelhe a essa experiência eu vou ter certeza que vale a pena. Quem sabe um dia.
Senti o que realmente é teatro. Nunca vou esquecer. Nunca será efêmero.

legenda:

foto 1 - Os pequenos palcos que giram

foto 2 - Juliana Carneiro da Cunha (Madme. Diaz) e Shaghayegh Beheshti (Perle)

21.1.08

conversas sobre Apolo e Dioniso

Uma das coisas mágicas que o Teatro proporciona é poder sentar em uma roda de atores com um filósofo e simplesmente discutir A Visão Dionisíaca do Mundo. Nada mais. Nada menos. A pauta é Nietzsche. Páginas angustiantes. Lidas pelo menos duas vezes. Causando insônia.

Nos relata esse alemão, com seu O Nascimento da Tragédia, que os gregos estabeleceram as divindades Apolo e Dioniso como a dupla fonte de sua arte. De repente, em uma roda de conversa no ano de 2007, essas divindades milenares são capazes de nos fazer sentir como se o tempo não tivesse passado. Como se tudo depois disso fosse besteira. Gregos. Invetaram o que é saber.

Simples. Apolo e Dioniso são opostos. Mas andam juntos. Apolo. Forma. Dioniso. Vontade. Não. Não é sobrenatural. É uma éspecie de fórmula que nasceu com os gregos. Transformo-se. Superego e Id. Neurose e Psicose. Razão. Emoção.

Tudo o que fica na forma é apolínico. Deus da bela aparência. Bela. Tem seu valor. Técnica. Mas não é vida. É uma escola de samba coberta de ouro com integrantes que não sabem o enredo. Distancia o homem da obra de arte.

Embriaguez é Dioniso. É o samba. É o estarrecimento perante a arte acontecendo. Quando você sente que a arte aconteceu. Dioniso está com você.

Naquela conversa eles estavam ali. Estão comigo para sempre agora.

O homem não é mais artista, tornou-se obra de arte, caminha tão estasiado e elevado como vira em sonho deuses caminharem. (F. Nietzsche)

20.1.08

sobre a nuvem do processo criativo

Francis Bacon/auto-retrato


Uma das coisas mais intrigantes do trabalho de um artista é tentar imaginar como foi o processo que o fez chegar naquele resultado apresentado. Quando sou surpreendida por uma obra é sempre o que me vem a cabeça: como alguém pode ter pensado nisso?


Estou lendo o livro Entrevistas com Francis Bacon, pintor escocês, entrevistas essas feitas pelo crítico inglês David Silvester ao longo de 25 anos de convívio com o pintor. Uma das coisas que mais está me surpreendendo em tais entrevistas é perceber, com os depoimentos de Francis, que o processo criativo apesar de ser individual e tão subjetivo é ao mesmo tempo tão parecido para todos. Angustiante. Inédito. Surpreendente.



Eu sou atriz. Ele é pintor. Você é escritor.


Veja bem, nós temos uma intenção, mas o que realmente acontece é produzindo durante o trabalho, essa é a razão porque é tão difícil falar sobre isso. Realmente, é no trabalho que acontece. E a maneira como isso funciona depende realmente das coisas que acontecem. Enquanto trabalhamos, vamos seguindo qualquer coisa parecida com uma nuvem, que é feita de sensações e está dentro de nós, mas não sabemos realmente o que ela é. (F. Bacon)


Reconfortante. Nem o artista sabe exatamente como se chega ao resultado. Não racionalmente. A linguagem das sensações é tão dificil que as vezes achamos que ela é invisível. Mas ela está ali. De alguma forma. Surge. Explode. Arrasa.

19.1.08

para o sonho de escrever se tornar realidade

Atuar.

Escrever.

Ler.

Dançar.


O que eu faço. O que eu amo. O que eu vivo.
Juntar como tudo isso em uma coisa só?
Não.
Não é uma vitamina que possa ser feita em um liquidificador.
Tive medo.
Vou tentar.

Laura. Foi você.

Obrigada.
 
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